Conflitos políticos, desestabilização e estratégia de negócios em debate no Congresso
A discussão sobre a regulamentação das plataformas digitais chegou ao Congresso, gerando disputas político-ideológicas que perderam força. O foco principal desse debate público é a regulamentação das redes sociais, motivada por investidas do bilionário sul-africano radicado nos Estados Unidos contra o poder judiciário brasileiro.
A discussão foi praticamente encerrada por Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados, que não deu prosseguimento ao projeto de lei das fake news. De acordo com Lira, um grupo de trabalho será criado para começar a discutir algo que na prática joga a discussão para a estaca zero, considerando que grupo de trabalho é uma maneira de dizer que algo não será resolvido.
O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, alertou o Congresso Nacional de que o STF deve tomar uma decisão até junho, quando deve seguir o julgamento do recurso extraordinário 1037396/SP, sobre a responsabilidade civil de provedores de internet, websites e gestores de redes sociais.
Os números
Enquanto o tema modela as conversas do cotidiano no Brasil, uma pesquisa Quaest revelou que as menções negativas contra o Supremo nas redes foram 68% no período entre 0h de domingo (7) e as 13h de terça (9). Foram mais de 30 horas com o assunto em alta. Já 32% das menções foram críticas a Musk. A média de menções por dia foi de 865 mil, com alcance de 72 milhões.
Nem (X)Twitter, nem STF
Estratégias de negócios estão em jogo no debate sobre a regulamentação da internet no brasil. Não regular atende também a agenda das big techs que não querem investir em mais trabalho. A regulamentação exige mais atenção para que crimes não sejam cometidos em suas páginas, o que afeta os negócios e a lógica dos algoritmos usados para atingir os usuários com as publicidades que vendem.
O Brasil é o sétimo maior produtor de lítio do mundo. Uma reportagem da revista Exame, publicada em dezembro de 2023, mostrou que a venda da Sigma Lithium estava na reta final. A empresa atraiu o interesse de “algumas das empresas mais admiradas de baterias e veículos elétricos no mundo, incluindo montadoras e baterias”. A produção de lítio de acordo com os padrões de ESG, e com potencial de crescimento, é um negócio que atraiu conversas com a Tesla e a BYD.
Contexto
Em discussão no Congresso desde 2020, projeto apresentado pelo Senador Alessandro Vieira do MDB de Sergipe – em 2022 passou a ser relatado pelo Orlando Silva do PCdoB Paulista um pedido de urgência que faria o PL andar mais rápido, era ano de eleições nacionais e foi rejeitada.
Naquele momento as redes sociais eram usadas de forma massiva pela extrema direita nacional para atacar as urnas eletrônicas, essa investida tinha por objetivo desestabilizar a democracia brasileira e preparar o cenário para um eventual golpe de estado, segundo a Polícia Federal era “a receita do golpe”: atuar com desinformação para minar a confiança dos cidadãos no sistema eleitoral.
A ideia de ruptura, se fosse abraçada por completo pelas forças armadas, seria elaborar decretos que previam a anulação das eleições e a prisão de desafetos políticos, em caso de derrota de Jair Bolsonaro, então presidente. As redes sociais, portanto, tiveram um papel central na tentativa de minar a confiança dos brasileiros nas urnas eletrônicas. A partir deste momento, o judiciário entrou em cena, com a ausência de uma legislação que pudesse engajar as plataformas de maneira objetiva no combate à desinformação.
O ministro Alexandre de Moraes ocupa um papel de protagonismo neste cenário, isso porque ele era relator dos inquéritos das fake News, das milícias digitais, e o presidente do Tribunal Superior Eleitoral. O poder exercido como chefe do TSE o permitiu mandar derrubar perfis antidemocráticos.
Art. 1º É livre a manifestação do pensamento e a procura, o recebimento e a difusão de informações ou ideias, por qualquer meio, e sem dependência de censura, respondendo cada um, nos termos da lei, pelos abusos que cometer.
Liberdade de expressão
O discurso da Liberdade de Expressão ilimitada venceu. Parlamentares contrários ao projeto de lei das fake News, apostaram no entendimento de que a nova lei, se aprovada, instalaria a censura no Brasil.
A ideia de ter uma agência reguladora para acompanhar a atuação das redes, sob a nova legislação passou a ser comparada ao “Ministério da verdade”, uma referência ao livro 1984 do George Orwell. No livro, esse ministério manipula a realidade e apaga desafetos do regime da história oficial.
Em 2023, pesquisadores dos estudos de internet detectaram que os algoritmos de algumas redes sociais estavam privilegiando conteúdos contrários ao projeto de lei. O Google chegou a colocar em sua página principal um texto contrário à regulação e o Telegram mandou mensagens aos seus usuários atacando o Projeto de Lei. O Telegram teve de se retratar por ordem judicial, mas a derrota aconteceu no plenário. O relator Orlando Silva retirou o PL da pauta.
Projeto de Lei 2630/2020
O PL 2630 discute vários temas e inclui a criação de novas regras para a moderação de conteúdo por parte das plataformas digitais.
A última versão do documento determina punições se a plataforma não agirem “diligentemente para prevenir e mitigar práticas ilícitas no âmbito de seus serviços”. Essa nova abordagem é inspirada em uma legislação recentemente adotada pela União Europeia, a Lei dos Serviços Digitais (DSA, na sigla em inglês).
Segundo o Marco Civil da Internet, as big techs não têm responsabilidade pelo conteúdo criado por terceiros e compartilhado em suas plataformas. No entanto, as empresas são obrigadas a excluir conteúdos em caso de decisão judicial.
Com a aprovação da Lei 2630, as plataformas poderiam ser responsabilizadas civilmente pela circulação de conteúdos que se enquadrem em crimes já tipificados pela lei brasileira, o que inclui crimes contra o Estado Democrático de Direito, atos de terrorismo, racismo, entre outros.
Como começou
Elon Musk passou a atacar Alexandre de Moraes dizendo que o ministro do supremo mandava a rede derrubar perfis e fornecer dados de usuários sem que a empresa pudesse dizer que aquilo era uma determinação judicial. Entre os comentários, ele cita a palavra ditador ao se referir ao ministro e sugere que as eleições de 2022 no Brasil foram fraudadas.
O jornalista americano Michael Shellenberger revelou que “Musk entregou a eles diversos e-mails trocados entre os antigos diretores jurídicos da companhia e dados internos mostrando exigências da Justiça brasileira feitas ao “X” para a liberação de dados de pessoas e bloqueio de perfis”.
O que diz o Tribunal de Justiça sobre os provedores de internet
A responsabilidade civil do provedor de internet pelos danos decorrentes do conteúdo gerado por terceiro é subsidiária, e ocorrerá em caso de descumprimento de ordem judicial que determine a indisponibilização do conteúdo ilícito ou da permanência de imagens/vídeos íntimos após a ciência do ocorrido. Tais sujeitos não realizam controle prévio de material disponibilizado na rede.
“(…) 4. A responsabilidade subsidiária do provedor de aplicações de internet por conteúdo gerado por terceiro (art. 18 do Marco Civil da Internet – Lei 12.965/14) exige o descumprimento de prévia ordem judicial (19) ou pedido do ofendido (21) para a exclusão do conteúdo.
Em termos práticos, uma ordem judicial é emitida para o provedor de internet, instruindo-o a remover determinado conteúdo da rede. Por exemplo, se um site continua online apesar da ordem judicial, uma investigação é realizada para identificar o provedor que não cumpriu a ordem. Essas investigações normalmente são confidenciais e, se for constatado que o provedor não agiu conforme a ordem judicial, ele pode sofrer penalidades.
(iii) devem, assim que tiverem conhecimento inequívoco da existência de dados ilegais no site, removê-los imediatamente, sob pena de responderem pelos danos respectivos;
Considerando um ano eleitoral, qual a melhor opção:
Buscar uma regulamentação equilibrada feita pelo Estado ou pressionar as empresas?
As eleições municipais ocorrem no Brasil em 6 de outubro. Enquanto isso, articulações planejadas já estão em andamento desde 2022. Em junho, quando deve ser votado sobre a responsabilidade civil das plataformas e provedores de internet, são vedadas algumas condutas aos agentes públicos:
Fazer ou permitir o uso promocional em favor de candidatos , partidos políticos ou coligação e ações como: aquisições de produtos e serviços de caráter social custeados pelo poder público, são algumas das ações vedadas nos três meses que antecedem as eleições.